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O Mistério das Pirâmides Bósnias










(English translation in a few days)
Raquel Ochoa, em Visoko

“Temos de parar de agir como professores e passarmos a agir como alunos.”

É assim que Sam Semir Osmanagich, fundador do Parque Arqueológico da Pirâmide do Sol da Bósnia, termina a entrevista.
Será que, caso existissem indícios de estar incorrecta, grande parte da teoria publicada seria revista pela comunidade científica? Haveria abertura para a reformulação das conclusões?
É isso que propõe Semir Osmanagich com a investigação das Pirâmides da Bósnia, as primeiras alguma vez encontradas na Europa, pois, segundo ele, o achado é tão fabuloso que obrigará a rever muitas das posições, rescrevendo a História. Confirmadas as suas suspeitas, estamos perante uma das construções humanas mais antigas jamais realizadas à face da terra.
Assim que se atravessa a ponte acedendo à vila de Visoko, a 70 quilómetros de Sarajevo, vê-se um monte atapetado de verde e arborizado apenas numa das frentes.
Saltam à vista os seus vértices alinhados e só o lado sul, segundo Richard Hoyle, colapsou, não se sabendo ao certo quando.
Sara Acconci, arqueóloga italiana formada na Universid desli Studi di Milano e Richard Hoyle, geólogo inglês formado na Leads University já moram aqui há meses e neste momento lideram as operações de escavação.
Ele reforça a sua certeza de estarmos perante construções piramidais:
- Normalmente estão alinhadas pelos pontos cardiais. Nesta só há um erro de 2 segundos. As de Gizé têm pelo menos 12.
A equipa não é maior pois as condições de trabalho são bastante difíceis. Richard apenas recebe alojamento. O que o faz permanecer é a paixão com que se entrega a este projecto. Quer ele, quer ela, quando interrogados sobre quanto tempo passarão em Visoko, nem três segundos demoram a responder:
- O resto da minha vida.
A dedicação é evidente mas a verdade é que Sara já recebeu emails dos seus professores deixando um claro aviso: “Caso persista neste projecto, quando voltar a Itália, jamais encontrará emprego”. A sua actuação, segundo eles, entrará no descrédito generalizado.

Até ao momento, como refere a equipa que aqui trabalha, foram descobertas cinco pirâmides: a do Sol – a maior, a da Lua, a do Dragão, Terra (Mãe Natureza) e a do Amor. As escavações decorrem desde 2006 e desde esse ano recebem voluntários para aqui trabalharem no Verão.
As pirâmides interessam a um número crescente de pessoas, e há quem ocorra ao local para meditar, grupos de observação de fenómenos sobrenaturais ou simplesmente curiosos.
Sara diz que só acredita no que vê, que o seu trabalho se baseia em dados científicos embora compreenda o porquê das pessoas encontrarem neste local um local de “peregrinação”. Porém realça que estes visitantes desaparecem por completo no Inverno, quando só está por cá ela e poucos mais, dedicando-se sobretudo à escavação dos túneis.
Quem não acredita de todo no trabalho desta equipa é o director do Museu de História de Visoko, Senad J. Hodovic. Foi ele quem convidou pela primeira vez Semir para visitar a vila, em 2005. Apressa-se a afirmar que não foi este quem descobriu os túneis, há muito que estavam descobertos. De facto, nos arredores há várias entradas para uma rede de túneis e até agora ninguém sabe a sua real extensão.
Segundo ele, não é possível encontrar aqui muitos cientistas a operar porque se recusam a ser comprados. É totalmente céptico em relação aos trabalhos que decorrem, ali, a poucos quilómetros do museu.
- Muito dinheiro foi investido e poucos resultados concretos. Não podem chamar pirâmides a algo que ainda não foi provado como tal. É contra isso que me insurjo.
Há muito tempo que não volta às escavações, nem sabe precisar data.
Essa é uma das acusações de Sara.
- Desde 2006 que não vem cá ninguém do Governo Bósnio, nem da comunidade científica nacional. E já se descobriu tantos factos novos desde aí. Ninguém quer ver. Fazem questão de não ver.

Túneis extensos
Ao longo dos túneis da maior pirâmide posicionam-se umas esculturas semelhantes a grandes rochas lavadas por águas correntes durante séculos. Aparentemente foram coladas uma à outra, formando blocos indivisíveis.
Ainda não foi possível perceber quem as terá trazido para ali e como. A maior encontrada pesa cerca de 4 toneladas.
Sabe-se que quando as retiraram dos locais onde se encontravam, a água começou a inundar todo o túnel, funcionando assim como uma espécie de “tampões” que controlam os canais fluviais subterrâneos, como explica Richard Hoyle. Na sua opinião, é verdadeira tecnologia o que se observa nestas esculturas, um conhecimento evoluidíssimo de como controlar os lençóis freáticos. Essa é aliás uma das teorias: as pirâmides teriam sido construídas para canalizar e controlar a água.
Mas esse talvez não tenha sido o achado mais importante. Em 2007 achou-se um pedaço de madeira agarrado a uma destas esculturas. Foi enviado para a Universidade de Kiel na Alemanha e para a Universidade de Tecnologia em Gliwice na Polónia e os resultados dataram-no de 30 000 a 40 000 anos.

As certezas científicas
Afinal de contas, qual a base científica de tudo isto? Tratam-se ou não de pirâmides?
Realizou-se em 2008 a Primeira Conferência Científica Internacional, reunindo uma equipa pluridisciplinar contando com 55 cientistas de diversos pontos do mundo. As conclusões foram peremptórias – Nabil Swelim, que descobriu quatro pirâmides no Egipto afirmou num relatório arqueológico que “ A pirâmide bósnia do Sol é a maior pirâmide do mundo”.
Mede 220 metros, recorde-se que a Grande Pirâmide de Gizé media 146,6 metros – hoje mede 137.
Ali Barakat, depois de uma visita de 42 dias concluiu que a mesma é desenhada e construída por mão humana e formada por blocos.
Dessa conferência realçam-se outras conclusões. Oleg Khavroshkin, depois de dois anos de pesquisa com a sua equipa, percebeu que as pirâmides bósnias pela sua forma correspondem às pirâmides egípcias e uma equipa de geofísicos do Instituto Sérvio de Física, da Universidade de Belgrado, cujo líder é Dejan Vuckovic, concluiu que debaixo da terra há diversas anomalias que não podem ser explicadas pela acção da natureza. Estabeleceu-se a existência de paredes contínuas, blocos ajustados e muitas passagens circuláveis.
O solo que cobre as pirâmides foi analisado pelo Instituto Federal de Agrapedologia e concluiu que estão soterradas há mais de 12 000 anos.
Contrariamente ao que seria de esperar, o ar que se respira nos túneis é surpreendentemente fresco e limpo.
Estes, a dado momento da história, foram fechados com material orgânico, por isso há dois mistérios para resolver: quem os construiu em primeiro lugar; quem os selou e porque motivo?
Mistérios não faltam por aqui.
O Instituto Parisiense de Geopolimias em 2007 fez a análise ao conglomerado encontrado, material de que são revestidos os túneis, e concluiu que é 5 vezes mais resistente que o melhor conglomerado que temos hoje em dia.
O pedaço de madeira encontrado estava num vácuo entre as pedras e a areia. Desconfia-se que é do tempo em que a água inundou os túneis. Os arqueólogos que ali trabalham julgam que se se vier a confirmar este dado os túneis em si seriam mais antigos do que 32 000 anos, tornando num dos mais antigos oásis arqueológicos da Europa e do mundo.
As pirâmides do Egipto não terão mais de 5000 anos.

A voz das pirâmides
Foi detectada a emissão de ultra-sons muito fortes no topo das pirâmides bem como do seu interior. Heikki Savolainen, engenheiro de som, está aqui durante uma semana a convite de Paollo Debeltolis professor doutorado em Antropologia/dentista/ médico e estudante de Direito que há algum tempo investiga este lugar. Paollo pediu ao seu amigo finlandês que viesse gravá-los e os analisasse posteriormente em estúdio.
- “A voz das pirâmides” interessa-me de um ponto de vista médico. Os ultra-sons são importantes para as endorfinas. – esclarece Debeltolis.
Cavkas, pássaros semelhantes a melros grandes mas que misturam tons de azul na sua cauda, pousam aqui e ali indiferentes à movimentação nos subterrâneos. Não devem entender o interesse pelo mundo do subsolo, nem se atrevem a espreitar.
Já no topo da Pirâmide do Sol, toda a área é muito bonita e do ponto de vista turístico, só por si, encontra-se motivo mais que suficiente para uma visita. Silencioso, o monte é ponto de escuta de todos os sons provindos da região de Visoko. O comboio passa e apita, a auto-estrada ao longe movimenta pessoas com pressa, e um habitante local, por ser domingo, partilha alto demais a música com os vizinhos. Um casal que ali passeia, além da equipa de estudiosos, observa o horizonte com uma expressão intrigada. Apontam para a pirâmide da Lua que se desenha ali em frente.
O topo do monte é um observatório, um gigante miradouro de 360º para uma paisagem de montes e neblinas entrecruzando-se.
O exército bósnio durante a guerra controlou os túneis e o topo desta pirâmide. A pirâmide da Lua, por sua vez, está minada, as escavações só podem prosseguir numa pequena zona.
Mas não é a única dificuldade que a equipa enfrenta. O homem que há uns anos comprou o Plateau da pirâmide do Sol por 8000 euros– é como chamam à plataforma que dá acesso ao topo da montanha e que é feito de enormes blocos sobrepondo-se - só o vende agora por 1 milhão.
Devido às obras numa moradia ali situada, foram desviados alguns blocos e podem observar-se num amontoado. São enormes. Esta forma de construção de pirâmides é totalmente desconhecida. O plateau é uma espécie de terraço que dá acesso a um dos lados da construção, suavizando a subida até ao topo. Esta seria uma das primeiras áreas a escavar, caso não estivessem impedidos.
A Fundação sem fins lucrativos dirigida por Semir Osmanagich é quem detém o monopólio da exploração deste parque arqueológico. Foi criada com o intuito de o proteger e de o desenterrar das entranhas da terra.
O director do Museu de História Senad J. Hodovic é de opinião contrária. Acredita que a fundação é uma forma de captar em exclusivo todos os fundos, por isso uma forma muito sagaz de ganhar dinheiro.
- Com os recursos já investidos, já deviam existir certezas muito mais concretas do que as apresentadas.


Pirâmide da Lua
No dia seguinte, ao pequeno almoço, Sara entrega a Richard um saco de plástico dentro de outro cheio de pequenas pedras.
Crê serem peças de cerâmica e moedas. Ele olha e não parece muito convencido.
- São as moedas mais antigas alguma vez encontradas – diz-lhe a arqueóloga. Gracejam. Não se entende se estão a falar a sério ou a brincar.
Richard não se inibe. Pega naquilo que parece ser uma pedra redonda e coloca em cima da mesa com estrondo.
- Pago eu os cafés, então.
A cidade tem bastante gente e é preenchida por casas de dois andares com telhados bem vermelhos. As crianças vão para a escola como em qualquer outra parte do mundo.
É hora de visitar a pirâmide da Lua e aqui as evidências são um pouco mais perturbadoras.
Em plena guerra da ex-Jugoslávia, o proprietário da base da pirâmide, que hoje apenas usa aquela casa para passar o fim-de-semana, encontra-se isolada num monte, decidiu escavar um buraco para encontrar água. Deu com um primeiro nível de pedras posicionadas em forma pavimento. Depois um segundo. E um terceiro, quarto, quinto, sexto… São visíveis mais de quinze níveis de pavimentos justapostos, ao longo de dois metros, e o que está escavado será apenas metade da base da pirâmide, pelas medições já feitas por aparelhos.
Richard não tem dúvidas que se trata de uma construção e não de uma maravilha geológica.
De qualquer modo, deixa escapar a sua crítica. Mesmo que se tratasse de um fenómeno geológico, estaríamos a falar de uma autêntica maravilha, algo que devia ser estudado.
Olha à sua volta e acrescenta.
- Porque é que sou o único geólogo aqui neste momento?
A descida para a vila faz-se com o pôr-do-sol. Os montes ondulados sintonizam-se com a bruma e a cor arroxeada.
Heikki pede uma paragem ao condutor do jipe para fotografar vários aspectos da bela paisagem. Volta ao carro e coloca os cotovelos no encosto banco observando a vastidão enquanto suspira.
- Agora sinto-me como o Papa.
















Comentários

  1. É absolutamente espantoso. Nunca tinha ouvido falar da existência de Pirâmides na Bósnia e com probabilidade de serem mais antigas que as do Egipto. Importa divulgar e que prossigam as investigações.

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  2. É uma viagem que (ainda) me está "atravessada".

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